segunda-feira, 30 de junho de 2014

As Cavalhadas de Vildemoinhos

No ano de 1652 Portugal sofreu um grande período de seca. A seca foi de tal maneira grave que as culturas agrícolas foram muito afectadas.
Em Viseu, como em geral em todo o país, essa calamidade prejudicou os agricultores desse tempo.
Os proprietários dos terrenos agrícolas das margens do rio Pavia, que corre junto à cidade de Viseu, ordenaram aos seus trabalhadores rurais que desviassem parte das águas do referido rio a fim de poderem regar as suas propriedades. Dessa situação resultou que o rio Pavia viu muito diminuído o seu já pequeno caudal, de tal forma diminuído que quando o rio passava em Vildemoinhos as suas águas não tinham força para moverem as mós dos moinhos lá existentes.
Vildemoinhos é uma povoação dos arredores de Viseu, onde desde longa data os seus habitantes se dedicam à moagem  do trigo e do milho e à fazedura do pão.
Nesse ano de 1652, dado o pequeno caudal do rio Pavia, as mós dos moinhos pararam, não permitindo fazer farinha e sem farinha não se pode fabricar o pão. Por isso, quando tiveram conhecimento do desvio  a montante das águas do rio os homens de Vildemoinhos levantaram-se num grande protesto e, organizando-se em grupos, reposeram de noite as águas desviadas no seu curso natural.
Essa atitude provocou uma grande contenda dos proprietários das terras contra os moleiros e padeiros de Vildemoinhos. As escaramuças foram tão grandes que as autoridades locais tiveram de intervir tendo sido entregue ao juiz da comarca o julgamento da situação existente. Com esse encaminhamento do processo os moleiros serenaram, aguardando a resolução do caso. Mas não muito confiantes na justiça dos homens logo solicitaram a protecção de São João prometendo que, no caso de vencerem a causa, todos os anos iriam à Capela de S. João da Carreira, no dia do referido Santo, montados nos seus cavalo e jumentos, prestar-lhe homenagem e demonstrar-lhe gratidão.
O meritíssimo juiz de Viseu na sua douta sentença declarou que o Rio Pavia não era pertença de ninguém. Todos poderiam utilizar as suas águas, sem as conspurcar, mas não era permitido desviá-las do seu curso natural.
Ficaram muito reconhecidos os homens e mulheres de Vildemoinhos ao Santo e todos os anos desde essa remota data, isto é desde há 362 anos, no dia de São João, representantes do moleiros e padeiros da referida povoação, montados nos seus cavalos vão até à capela da Carreira, do outro lado da cidade, agradecer ao Santo a sua ajuda no pleito que tiveram com os proprietários da terras.
Mas de Vildemoinhos até Viseu não vão sozinhos. São seguidos por um numeroso cortejo de carros alegóricos de que fazem parte alguns moleiros fabricando farinha nas suas mós, alguns padeiros fazendo pão nos seus fornos e cesteiros criando bolsas e cestos de verga.  Há também outros carros invocando assuntos actuais da vida nacional e de Viseu. O cortejo onde também são incorporadas bandas de música popular percorre as ruas centrais de Viseu antes de regressar a Vildemoinhos.E é sempre lembrado nesse cortejo o Lusitano, clube da terra, e Carlos Lopes campeão olímpico da maratona de Los Angeles em 1984 por ser um dos seus, uma vez que nasceu em Vildemoinhos.



sábado, 28 de junho de 2014

A Revolta da Maria da Fonte

Foi chamada assim a rebelião que eclodiu no Minho, em Abril de 1846, durante o governo de Costa Cabral, no tempo da Rainha D. Maria II.
Começou por ser uma pequena arruaça de mulheres que tinha por cabecilha Maria da Fonte, uma rapariga da aldeia de Fonte Arcada, pertencente ao concelho de Póvoa de Lanhoso, no Minho.
Esta arruaça teve como causa, ou pretexto, a não aceitação das leis de Costa Cabral que proibiam os enterros nas igrejas.
A primeira manifestação verificou-se em 19 de Março de 1846 quando um grupo de mulheres armadas de chuços e foices, na aldeia de Santo André de Frades, concelho de Póvoa de Lanhoso, obrigou o pároco a dar sepultura dentro da igreja ao corpo de uma mulher que ia a enterrar.
Os tumultos prosseguiram e no mês seguinte alastraram por todo o Minho e Trás-os-Montes, começando a tomar uma feição de luta de guerrilhas e de movimento miguelista  perante a intervenção  de uma força de infantaria vinda de Braga.
Costa Cabral pediu às câmaras poderes extraordinários para restabelecer a ordem. Esses poderes - suspensão de garantias, lei marcial - foram concedidos apesar da oposição de muitos deputados. Costa Cabral enviou então para o Norte, como comissário do governo, seu irmão José, ao tempo ministro da Justiça, para sufocar a rebelião.
As medidas que este tomou mais excitaram os ânimos e acenderam a revolta. Em Vila Real surge a primeira Junta Provincial revoltosa, presidida pelo morgado Mateus, logo seguida de outras espalhadas por todo Norte, pelas Beiras e até pela Estremadura. Também em Santarém se organiza uma Junta, presidida por Manuel Passos, ao mesmo tempo que o visconde de Vinhais que comandava a divisão miliciana de Trás-os-Montes se coloca ao lado dos revoltosos.
José Costa Cabral vê-se obrigado a regressar a Lisboa. Perante tão grave alastramento do movimento revolucionário o Duque da Terceira, presidente do Ministério, convocou uma reunião do gabinete a que presidiu a própria Rainha, aí declarando que não tinha força suficiente para debelar a revolta e propondo, como único meio de lhe pôr cobro, a imediata demissão do Ministério.  Perante a gravidade da situação, apesar da protecção que sempre dispensara a Costa Cabral, a Rainha concordou.
O movimento saíra pois vencedor e os irmãos Cabral, vencidos, emigraram para Espanha.
Nesse tempo era compositor residente no Teatro Nacional de S. Carlos o maestro Ângelo Frondoni. Ocupava esse lugar por concurso público tendo sido preferido entre outros concorrentes dos quais constava um nome que foi mais tarde reconhecido mundialmente: Giuseppe Verdi.
Ângelo Frondoni entusiasmado com a revolta das mulheres, encabeçada pela Maria da Fonte Arcada compôs a música vibrante do Hino da Maria da Fonte, também conhecido por Hino do Minho, hino que ultrapassou as barreiras do tempo por ser considerada uma obra prima entre as composições do seu género, sendo ainda nos tempos actuais muitas vezes executada por orquestras sinfónicas.